Plantamos algumas estacas de hortênsias no sítio!
As hortênsias, pertencentes ao gênero Hydrangea,
são arbustos semilenhosos originários da China e do Japão capazes de
atingir até 2,5m de altura. Dentre as espécies deste gênero destaca-se a
H. macrophylla, que dá nome a uma das regiões turísticas mais
tradicionais do estado do Rio Grande do Sul, a Serra Gaúcha ou Região
das Hortênsias. Caracterizadas por suas inflorescências exuberantes,
grandes, densas e numerosas, são utilizadas com frequência na composição
de jardins e parques e como flores de vaso na decoração de ambientes.
Além disso, apresentam uma gama natural de cores, que variam do branco a
tons de azul, púrpura, rosa e vermelho.
A produção comercial da
espécie é centralizada principalmente no estado de São Paulo e é
realizada mediante estacas a partir da ponta de ramos, podados com 8 a
10cm de comprimento, sendo cultivadas em local protegido até o seu
completo enraizamento. Contudo, para a obtenção de mudas com melhor
qualidade de raízes, número de brotos e porcentagem de enraizamento,
estas devem ser oriundas da parte basal dos ramos. O período de
enraizamento pode variar de 20 a 40 dias após os ramos serem
acondicionados em substrato adequado. A estaquia pode ser realizada
diretamente no solo, em substratos comerciais ou em caixas de areia, mas
sempre priorizando uma boa aeração e umidade dos mesmos. Após o
enraizamento, as mudas podem ser transplantadas para vasos ou local
definitivo de cultivo, exigindo irrigação periódica até o pleno
estabelecimento.
As mudas de hortênsia podem ser cultivadas em
ambiente variados uma vez que a espécie apresenta ótima adaptação à
ambientes de clima ameno (12 a 21ºC), desenvolvendo-se bem tanto a pleno
sol como meia-sombra e, em solo úmido, livre de encharcamento. Essa
espécie se desenvolve preferencialmente em solos com elevada fertilidade
e altos teores de matéria orgânica, mas também pode ser cultivada em
encostas e a beira de ruas e estradas, protegendo e embelezando essas
áreas. Quando cultivadas em áreas externas, a realização de podas é
importantíssima a fim de produzir plantas mais compactas e com elevado
número de inflorescências, deixando as mesmas ainda mais atraentes.
As
hortênsias apresentam pouca ocorrência de pragas e moléstias, mas
alguns cuidados fitossanitários devem ser observados no cultivo dessa
ornamental, em especial na obtenção das mudas. É durante esse período,
que fungos presentes em solo ou substratos contaminados podem infectar e
causar a baixa pega de estacas. Já na fase adulta de desenvolvimento,
doenças como o oídio e o mofo cinzento são as mais importantes para a
espécie, sendo seu controle baseado na eliminação de ramos e plantas
contaminadas, além de aplicações de fungicidas de forma preventiva.
Quanto as pragas, o tripes e o ácaro rajado são as principais espécies
incidentes na cultura, sendo controlados por inseticidas e acaricidas,
respectivamente, aplicados de forma curativa.
A definição da
coloração das sépalas de hortênsias, parte colorida das flores, por sua
vez, traz um segredo. Elas podem facilmente mudar de vermelho para azul,
dependendo do manejo adotado e das condições de cultivo. No entanto,
todas as cores são desenvolvidas a partir de um único pigmento
principal, uma antocianina nomeada delfinidina 3-glicosídeo. O conteúdo
deste pigmento em sépalas é responsável pela tonalidade das
inflorescências, ou seja, quanto maior a quantidade deste, mais intensa é
a coloração.
É de conhecimento geral que as hortênsias cultivadas
em solos alcalinos, com pH próximo ou superior a 6,5, produzem
inflorescências de sépalas róseo avermelhadas e em solo ácido, com pH
abaixo de 5,5, manifestam a coloração azul. No contexto mundial,
estima-se que 50% dos solos agrícolas enfrentem problemas com a
acidificação e consequentemente, com a liberação de metais tóxicos para
as plantas, como o alumínio (Al). Em áreas de cultivo de plantas
ornamentais e/ou no solo utilizado em vasos e floreiras, a situação não é
diferente. A partir desse conhecimento, muitos estudos foram
impulsionados buscando desvendar os mecanismos envolvidos na definição
da coloração azul apresentada pelas hortênsias.
Em condição de
baixo pH, o alumínio fica disponível na solução do solo em sua forma
tóxica (Al+3), sendo absorvido pela planta e translocado para o vacúolo
celular, onde é armazenado. O vacúolo ocupa grande parte da célula
vegetal, sendo responsável por armazenar de forma definitiva ou
transitória, substâncias tóxicas ao metabolismo da planta, neste caso, o
alumínio. Esse mecanismo de detoxificação interna desenvolvido pelas
hortênsias, exige a participação de proteínas transportadoras e
exsudatos orgânicos capazes de quelar o Al+3, ou seja, se ligam a esse
elemento e produzem substâncias não tóxicas a planta, impedindo danos
celulares e possibilitando o seu transporte até o vacúolo. Inúmeros
transportadores já foram relacionados com a mobilidade de Al+3 e do
complexo citrato-Al+3 desde as raízes até os vacúolos em hortênsias, incluindo transportadores das famílias das aquaporinas, MATE (Multidrug and Toxic Compound Extrusion), transportadores de Alumínio NRAMP e ABC (ATP-binging cassette).
As
hortênsias também apresentam o armazenado de Al+3 no vacúolo das
sépalas, onde formam um complexo estável e de coloração azul com o
pigmento delfinidina 3-glicosídeo. Quanto maior o teor de
delfinidina-3-glicosídeo, mais alumínio pode ser acumulado nas sépalas
das flores, mudando sua cor para azul e/ou intensificando a mesma.
Estudos com a espécie constataram que inflorescências com sépalas
vermelhas, púrpuras e azuis de uma mesma cultivar acumularam entre 0-50,
10-100 e 40-500 µg de Al+3.g-1
sépalas frescas, respectivamente. Resultados similares foram encontrados
nas folhas destas plantas. A partir destas descobertas, é possível
compreender como ocorre a manipulação da coloração das sépalas por meio
do controle do pH, disponibilidade de alumínio no solo e manejo de
podas.
A manipulação da coloração é baseada em práticas de manejo.
Por exemplo, se o objetivo é obter hortênsias de coloração rósea a poda
dos arbustos, com a eliminação do maior número de folhas, tem por
finalidade eliminar o Al+3 que está acumulado nos tecidos. Por sua vez, a
manutenção da alcalinidade do solo ou próximo a isso deve ser realizada
com calagem, impedindo que esse metal seja disponibilizado e absorvido
pela planta. No entanto, em casos de solos ácidos com disponibilidade de
alumínio, mesmo realizando a poda e tendo adquirido uma muda com a cor
rosa, as inflorescências irão adquirir, com o passar do tempo, a cor
azulada.
Além do Al+3, outros componentes internos das sépalas são
responsáveis por conferir a cor azul. A mistura de
delfinidina-3-glicosídeo com outros co-pigmentos, como ácido
5-O-cafeoilquínico, ácido 5-O-p-cumaroilquínico ou ácido
3-O-cafeoilquínico, presentes nos vacúolos, conferem uma coloração
azulada as inflorescências. Esses co-pigmentos auxiliam na manutenção da
estabilidade do complexo azul. Concomitantemente, o pH desta solução
interna da célula exerce um efeito considerável sobre o desenvolvimento
da cor. Nesse caso, o pH que confere a coloração azul (pH≈4,0) é
significativamente mais elevado que o associado a coloração vermelha
(pH≈3,0).
Curiosamente, as sépalas de H. macrophylla cv.
HovariaTM 'Homigo' podem mudar de coloração durante a maturação e
senescência, sendo um indicativo do estádio de desenvolvimento em que as
plantas se encontram. Em um primeiro momento as sépalas apresentam-se
despigmentadas (brancas), alterando sua coloração para azul, verde e por
último marrom avermelhada. A coloração azul é resultado do complexo
entre antocianina, co-pigmentos e Al+3, que com a maturação é degradado,
sendo desenvolvida a cor verde – pela presença de cloroplastos. Por sua
vez, com a senescência, são degradadas as clorofilas dos cloroplastos e
cianidinas (outra antocianina) são produzidas, conferindo uma coloração
avermelhada, como uma imitação do outono.
A partir do exposto, o
segredo das hortênsias é que, não existem hortênsias de várias cores,
mas sim, plantas que adquirem cores variadas de acordo com o seu modo de
cultivo. Fatores como o pH do solo, disponibilidade de Al+3, presença
de co-pigmentos, pH vacuolar e estádio de desenvolvimento desempenham
papel fundamental na coloração das flores. Assim, a classificação das
hortênsias é realizada por sua intensidade de coloração ou conteúdo de
delfinidina 3-glicosídeo, independentemente da cor atual das sépalas,
uma vez que a definição da cor é um processo celular complexo e
associado as condições de cultivo. Sendo assim, a manipulação da cor das
flores das hortênsias, de tons de azul ao avermelhado, pode ser
realizada pelo próprio produtor ou jardineiro, a partir da alteração do
solo de cultivo ou do pH do mesmo. Ainda nesse sentido, é possível a
obtenção de um jardim com hortênsias de cores variadas, tendo como
origem mudas de estacas de apenas uma única planta, não gerando custos
adicionais na obtenção de mudas variadas.
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Figura 1. Flores de hortênsias cultivadas em pH≈4,0 (Maior teor de delfinidina 3-glicosídeo). | Figura 2. Flores de hortênsias cultivadas em pH≈3,0 (pH extremamente ácido). |