Sempre que falo sobre espécies diferentes de árvores nativas brasileiras, ou até mesmo quando dou palestras sobre a importância da flora para nossas vidas, uma árvore em especial chama a atenção de todos: o ipê!
Adoro compartilhar com todos a existência do ipê-verde,
por exemplo. Você já sabia que ele existe? Vez ou outra, noto uma certa
confusão entre as diversas espécies dessa planta e suas cores, como a
presença mística do ipê-azul. Dedicarei este texto, então, ao ipê, para que todos possam conhecer um pouco mais sobre suas particularidades e aprofundem seu amor por esta árvore tão linda.
O mundo dos ipês é um mundo muito grande e – claro! – encantador. Começando por sua família botânica – Bignoniaceae –, que abraça 110 gêneros e cerca de 840 espécies de árvores, arbustos e lianas (cipós).
O Brasil em particular é considerado o maior centro de diversidade dessa família botânica,
pois em todo território nacional, de norte ao sul do país, são
encontrados 33 gêneros e 412 espécies. Destas, um total de 199 espécies
são endêmicas, ou seja, ocorrem somente aqui e em nenhum outro local do
mundo, estabelecendo, assim, uma relação altamente complexa de interação
com todos os seres e sistemas do seu ambiente de ocorrência natural.
As lindas flores desta família – facilmente identificadas devido a seu formato de pequenas trombetas
– são muito atrativas para grande parte da fauna, como por exemplo:
vespas, abelhas, aves, morcegos, borboletas e mariposas. Algumas flores
têm, até mesmo, finalidades alimentícias, como o ipê-amarelo, que pode ser saboreado em saladas.
Eis, aqui, duas árvores da família Bignoniaceae que costumamos encontrar com facilidade e não são brasileiras: espatódea e ipê-de-jardim.
Espatódea, tulipeira, árvore-de-bisnagas, tulipeira africana
Nome científico: Spathodea campanulata
Origem: África
Particularidade: bastante comum na arborização
urbana das cidades brasileiras, a espatódea também faz parte das
lembranças de brincadeiras de infância – com seus botões florais e
sépalas (área que sustenta as pétalas) as crianças jogam jatinhos de
água nos amigos. Suas flores podem ser laranja ou amarelas.
Ipê-de-Jardim, amarelinho, bignônia-amarela, carobinha, guarã-guarã, ipê-mirim, sinos-amarelos
Nome científico: Tecoma stans
Origem: Estados Unidos e México
Particularidade: seu porte pequeno, quase arbustiva e
por não perder suas folhas ao florescer, tornou-se uma das árvores
exóticas confundida com nossos ipês nativos mais comuns dos jardins
residenciais e na arborização das cidades, principalmente como opção em
calçadas onde passa fiação elétrica na parte superior. Muitas pessoas
acreditam que é uma espécie brasileira, mas certamente não é o caso.
Suas sementes são produzidas em quantidade grandiosa e o poder
germinativo é alto, isso porque ela não encontra predadores de suas
sementes em nossos biomas brasileiros. Sua presença tem sido monitorada
para avaliar se está impactando negativamente a distribuição de espécies
nativas – sendo considerada invasora.
Nossos ipês
Em meio às espécies de ipê mais comuns aqui no Brasil – conhecendo um pouco mais do tamanho desse universo
– é mais fácil perceber as diversas tonalidades de cor de suas flores;
as diferenças nas estruturas das folhas compostas por três, quatro,
cinco, seis ou sete folíolos; os detalhes de textura da casca; e a forma
das vagens e das sementes. Cada um desses detalhes em conjunto pode nos
apresentar espécies de ipê, ainda que similares, bastante particulares.
Eles são muito mais do que os nomes que lhes foram dados obviamente
pelo colorido de suas flores, como ipê-branco, ipê-rosa, ipê-amarelo,
etc. Dentro de cada uma dessas categorizações simplistas, existe uma
grande diversidade de espécies, de tamanhos e de áreas de ocorrência,
muitas vezes diferenciadas.
Agora faço uma provocação para você, leitor: procure apreciar os ipês também nos momentos em que eles não estão floridos.
Vamos praticar mais desse vínculo apreciativo e de cuidado com nossas
árvores, mesmo quando elas estão em momentos de vida menos exuberantes?
Assim, é possível reparar na tonalidade das folhas novas que brotam ou
na cor que fica gradualmente alterada quando a árvore se prepara para
desprender todas as folhas. E os pequenos brotos de flores ou
crescimento das vagens? E as incríveis sementes? Já coletou algumas pelo
caminho e imediatamente colocou-as para germinar?
Suas
sementes aladas são dispersadas pelo vento. São pequenas joias
brilhantes e translúcidas. No miolo da membrana, o embrião de uma nova
árvore. A madeira dos ipês é valorizada e reconhecida mundialmente por
suas propriedades de resistência e dureza. Até hoje, toras inteiras são
facilmente encontradas em carregamentos de extração madeireira ilegal.
Uma das espécies de ipê de flores rosadas contém, em
suas estruturas, o princípio ativo e os medicamentos para tratamento
oncológico. Os ipês também são conhecidos por diversos outros nomes
populares, como estes:
ipê-amarelo, ipê-ouro,
ipê-da-serra, aipê, ipê-branco, ipê-mamono, ipê-mandioca, ipê-pardo,
ipê-vacariano, ipê-tabaco, ipê-do-cerrado, ipê-dourado, ipezeiro,
pau-d’arco, taipoca,
piúva, piúna, ipê-roxo-de-bola, ipê-una, ipê-roxo-grande, ipê-de-minas,
ipê-comum, ipê-reto, ipê-rosa, ipé, ipeúna, ipê-do-brejo, ipê-da-várzea
Ipê-azul existe?
O mais comum é confundir as tonalidades de roxo e azul. Como alguns ipês têm o nome popular ipê-roxo,
muitas pessoas esperam encontrar flores roxas com tonalidade mais
azulada durante as floradas. Normalmente, as espécies que chamamos de
ipê-roxo na verdade apresentam flores em tom de rosa em uma tonalidade
bastante forte, mas, mesmo assim, mais magenta (pink) do que azul.
No entanto, existem os jacarandás, também da família Bignoniaceae as espécies do gênero Jacaranda sp.
São cerca de 36 espécies, sendo que 32 são endêmicas do Brasil. Por
serem parentes da mesma família, as flores de todas essas espécies são
muito similares em formato com as dos tradicionais ipês. E elas, sim,
possuem tonalidade arroxeada-azulada. Por isso, quando algumas pessoas
dizem que viram um ipê-roxo ou azul, na maioria das vezes estão se
referindo aos jacarandás muito presentes em nossos caminhos.
Neste exato momento, na primavera, podemos encontrar inúmeros
jacarandás floridos nas ruas arborizadas das cidades brasileiras. Lindos
e tão incríveis como os ipês, é importante notar uma diferença entre
eles: o formato das vagens, que lembram castanholas. Já as sementes, são
bem parecidas, assim como as flores.
E onde mora o ipê-verde?
Uma típica árvore do cerrado brasileiro – Cybistax antisyphilitica.
Suas flores são realmente verdes, essa característica deve denotar que
seus polinizadores a encontram mais devido seus atributos aromáticos do
que visuais.
Possivelmente é bastante visitada por fauna de hábito de vida
noturno. Quem já viu, marca o lugar para sempre voltar a encontrar. Quem
ainda não viu, tenho certeza que vai querer plantar.
Para encerrar este post com muito carinho e emoção em conhecer mais
sobre nossas árvores, vejam algumas fotos que fiz de alguns
ipês-verdes-do-cerrado que vivem perto do escritório do Instituto
Árvores Vivas na região central da cidade de São Paulo.
Fotos: Juliana Gatti (abertura – 2/4/5/6/7/8 /11) e Wikimedia
Edição: Mônica Nunes
Mestranda
na área de Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento Sustentável,
sua pesquisa dedica-se a avaliar a influência da natureza na qualidade
de vida de crianças e sociedade. Idealizou o Instituto Árvores Vivas em 2006, onde promove ações de conexão com a natureza por meio de apreciação, restauração e fomento da cultura ambiental.