Natália Menhem As heroínas que produzem os fertilizantes da minha horta de apartamento. Foto: Felipe Menhem.
Atualmente, minha grande diversão tem sido criar minhocas. Em meu
apartamento. É muito interessante observar a cara das pessoas quando
ouvem isso. Mas mais interessante é conviver com esse maravilhoso
processo natural na minha área de serviço. Talvez por ter uma formação
na área de Humanas eu me encante ainda mais com toda a vida que acontece
dentro daquelas caixas plásticas. Explico: sou cientista social,
trabalho na área ambiental e me interesso por questões socioambientais.
Mas apesar dessas questões ocuparem um papel central na minha vida, não
estudei as ciências da natureza.
Mas isso começou a mudar quando passei a refletir sobre o destino do
meu lixo caseiro. Já realizava a coleta seletiva, mas meu lixo orgânico
continuava indo para o aterro sanitário, que é considerado uma forma
moderna de tratar o lixo. Tudo bem, ainda temos centenas de municípios
brasileiros sem um sistema de coleta e tratamento de resíduos decente.
Porém, o aterro sanitário deixa de parecer moderno quando pensamos
quanto material reciclável acaba dentro dele.
“Um amigo já havia feito compostagem usando um
vaso grande em sua casa, mas isso não me livrou da insegurança de
tentar o que me parecia uma proeza no meu próprio apartamento. ”.
A começar pelo material orgânico.
Em pesquisa rápida, descobri que algo entre 50% e 70% do lixo doméstico é
orgânico. Isso significa que em um sistema em que a coleta seletiva e a
reciclagem são eficientemente executadas, ainda temos uma grande
quantidade de material descartado enchendo os aterros diariamente. Digo
material descartado porque não podemos chamar uma matéria tão rica de
lixo. Quase nada é lixo se o defirnmos como coisas que não tem mais
utilidade. Da mesma forma que plástico, papel, vidro e alumínio podem
ser reciclados e valem dinheiro, o resíduo orgânico significa húmus em
potencial, ou seja, um material nutritivo e que também vale dindim.
Passei a indagar o que podia fazer com meu lixo orgânico. Um amigo já
havia feito compostagem usando um vaso grande em sua casa, mas isso não
me livrou da insegurança de tentar o que me parecia uma proeza no meu
próprio apartamento. Meus receios, descobri posteriormente, são comuns a
todos que tem o mesmo interesse: e se der mal cheiro? E se der bicho? E
se der inseto? Na busca por uma solução, descobri então os kits de
minhocários caseiros, que permitem criar minhocas que trabalham como
biodigestores de grande parte dos resíduos orgânicos residenciais.
Continuei com os mesmos receios: e se aquilo exalasse um cheiro
horrível? E se o cheiro não fosse tão horrível, mas fosse extremamente
interessante para a Naomi, minha doce cadela? Imaginava chegar em casa
um dia e encontrar minhocas por todos os lados, depois que a Naomi
resolvesse investigar aquelas caixas. Meus morangos tomando sol na janela. Foto: Natália Menhem.
Demorei a criar coragem. Comecei minha hortinha, porém sem coragem
para comprar o minhocário. Até que um dia, descobri que tinha uma amiga
que era a feliz proprietária de um desses kits. Fui até a casa dela e vi
o processo em pleno funcionamento. Ela tinha um pouco mais de espaço do
que eu, mas vi que encontraria um espacinho para as minhas minhocas.
Logo em seguida encomendei o meu minhocário. Confesso que demorei um dia
até ter coragem de abrir o saco que continha a matriz de minhocas.
Lembrem-se que apesar do amor à causa, nunca tive intimidade com esses
bichinhos.
Desde então, observo a transformação dos meus resíduos orgânicos em
húmus e em chorume (na semana passada, enchi a primeira garrafa, com
quase um litro). O húmus é o resíduo que as minhocas geram, grosso modo e
de forma didática: seu cocô. Sim, as minhocas se alimentam de terra e
elementos orgânicos, e seus dejetos são extremamente nutritivos. O
chorume, nesse caso, não é aquele bem nojento que fica no fundo da
lixeira quando os moradores de uma casa se esquecem de esvaziá-la (pode
acontecer muito em repúblicas estudantis).
Muito pelo contrário, o
chorume que retiro do meu minhocário é o excesso de umidade que “pinga”
do húmus, e assim como o primeiro, é extremamente nutritivo. Para evitar
mal entendidos, algumas pessoas o chamam de fertilizante líquido.
Depois da primeira leva pronta, já posso colocar húmus e chorume
caseiros na hortinha e nos morangos que cultivo na janela do meu quarto.
Atenção: se for fazer isso em casa, observe sempre a quantidade
colocada. O chorume deve ser diluído em água e o húmus deve ser
misturado a terra, afinal de contas, são materiais com alto teor
nutritivo. Conto os detalhes na próxima coluna.
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