Mas a causa da morte e estagnação maciça dos plantios
é
muito simples, embora insuspeita
por Patrícia Shimabuku*
Nos últimos anos aumentou sensivelmente o número de árvores plantadas em nossa cidade por força popular (voluntariado), compensação ambiental e políticas públicas de arborização. Tornou-se comum, para quem observa árvores, ver alças de acesso, praças, parque, canteiros centrais e as margens da ciclovia repletas de mudas de árvores finas e compridas.
Contudo, é interessante notar que, após plantadas, muitas dessas mudas parecem que simplesmente não crescem, ficam estagnadas, sofridas. E outro tanto significativo simplesmente seca e morre, se transformando em um graveto retorcido. Poucos percebem esse problema silencioso, e quando há algum tipo de justificativa oficial a culpa é geralmente de supostos “atos de vandalismo” ou ataque de “insetos sociais” como as formigas.
Mas a causa da morte e estagnação maciça dos plantios é muito simples, embora insuspeita. Para descobri-lo basta olhar na base do tronco da muda, o que chamamos de “colo”. O que se vê invariavelmente é um tronco com inúmeras marcas de cicatrizes, buracos e cascas brutalmente arrancadas, às vezes em toda a circunferência, dando um aspecto de uma grave doença.
Observe: a cena de trabalhadores com roçadeiras cortando o gramado entre árvores ainda jovens nas áreas verdes. Isso faz parte das medidas para deixar a cidade com um aspecto melhor, mais arrumada, prevenir o aparecimento de animais peçonhentos.
A questão fica por conta de um detalhe inusitado, pois o tipo de equipamento (cortador de grama) geralmente chega bem perto do tronco da arvorezinha e encosta nela. Na tentativa de “caprichar” o trabalho e não deixar grama alta em volta da árvore, o equipamento arranca em círculo a casca, fazendo algo que pode matar o exemplar e é conhecido como “anelamento”, promovendo a interrupção total ou parcial do fluxo de seiva e sequelas para a planta.
A origem dessas lesões severas é relacionada diretamente com a existência de grama nos pés da muda e os equipamentos usados para seu corte. No Brasil, a maior parte dos gramados são podados com “roçadeiras”, máquinas com fios de nylon ou lâminas que em movimentos circulares cortam as folhas da grama. Durante o corte, o operador da roçadeira busca eliminar todas as folhas de grama alta em volta do tronco da árvore para um resultado estético, e nesse ato, o instrumento de corte encosta no tronco e invariavelmente arranca porções generosas ou toda a casca, provocando profundas feridas.
A lesão provocada é grave porque a casca da árvore é o local de passagem da seiva, que alimenta a planta, e quando interrompido por uma ação mecânica, é como se o sangue não circulasse mais em nossas artérias. Em botânica, esse procedimento de remoção da casca para a morte da planta é conhecido como “Anel de Malpigh”. E quando não ocorre em toda a extensão da casca e mata a muda, a deixa estagnada, em “coma” pela pouca passagem de seiva no remanescente de casca e forte empenho da planta em cicatrizar a ferida – o que dificilmente ocorre pela grande periodicidade de cortes.
A prevenção para esse problema é muito simples e barata, já adotada em cidades como Buenos Aires, e consiste em um pedaço de cano largo de PVC com uns 20 cm de comprimento, serrado longitudinalmente, colocado em volta do tronco e fixado ao solo por uma haste de metal que recebe os cortes da roçadeira e salva o precioso tronco da muda. Já na cidade do Rio de Janeiro, utilizaram um pedaço de cano de PVC cortado na vertical, como uma espécie de “perneira” para a muda.
Aqui em Botucatu, os voluntários (cujas mudas foram adquiridas com recursos próprios e/ou produzidas em suas próprias residências) sinalizam as mudas plantadas com garrafas tipo PET, caixinhas de leite, sacolinhas e etc. Porém, infelizmente, boa parte das mudas foram lesionadas. Observou-se também as árvores adultas compartilham das mesmas lesões.
Precisamos urgentemente resolver esse problema. Não adianta mais plantar árvores sobre gramados enquanto não houver treinamento/sensibilização do profissional da manutenção e/ou a instalação de dispositivos para a proteção do colo da muda. Só assim, essas mudas que custam caro e nos enchem de esperança vão poder cumprir seu papel esperado. Além disso, os responsáveis pelas políticas públicas de plantio no município precisam considerar o período (as estações climáticas), não realizar plantios de mudas em períodos de seca como realizado no ano anterior (Junho Verde), especificamente, quando se tratar de inúmeras mudas. Informo também que, o município de Botucatu tem uma Lei Municipal Complementar (776/2010) que “Dispõe sobre o código de arborização do município”
O texto redigido acima foi baseado na publicação da seção “Esquina” do Estadão.
*Patricia Shimabuku é farmacêutica industrial, professora e ativista socioambiental.
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