Trabalhos
desenvolvidos pelo Instituto Florestal (IF) comprovam que a presença de
cobertura florestal em bacias hidrográficas promove a regularização do
regime de rios e a melhora na qualidade da água. Os pesquisadores
científicos da Seção de Engenharia Florestal, do IF, Valdir de Cicco,
Francisco Arcova e Maurício Ranzini, embasaram suas teses de doutorado
em pesquisas sobre a relação entre a floresta e a água, elucidando
dúvidas e provando com números as suas proposições.
“As
bacias hidrográficas recobertas por vegetação florestal são as que
oferecem água com boa distribuição ao longo do ano, e de melhor
qualidade”, enfatiza Arcova, engenheiro florestal, doutor em Geografia
Física, pela Universidade de São Paulo, no IF desde 1985. Segundo ele,
parte da água da chuva é retida pelas copas das árvores, evaporando em
seguida em um processo denominado interceptação. A taxa de evaporação
varia com a espécie, idade, densidade e estrutura da floresta, além das
condições climáticas de cada região.
“Em
florestas tropicais, a interceptação varia de 4,5% a 24% da
precipitação, embora tenham sido registrados valores superiores a 30%”,
explica. Os pesquisadores ainda dizem que as pesquisas realizadas nos
laboratórios em Cunha, no parque Estadual da Serra do Mar, estimam o
valor de 18% de interceptação. O restante da água alcança o solo
florestal por meio de gotejamento de folhas e ramos ou escoando pelo
tronco de árvores. No solo, a água infiltra-se ou é armazenada em
depressões, não ocorrendo o escoamento superficial para as partes mais
baixas do terreno, como aconteceria em uma área desprovida de floresta.
“O
piso florestal é formado por uma camada de folhas, galhos e outros
restos vegetais, que lhe proporciona grande rugosidade, impedindo o
escorrimento superficial da água para as partes mais baixas do terreno,
favorecendo a infiltração. Também a matéria orgânica decomposta é
incorporada ao solo, proporcionando a ele excelente porosidade e,
consequentemente, elevada capacidade de infiltração.”
Uma
parcela da água infiltrada contribui para a formação de um rio por meio
do escoamento subsuperficial, e outra, é absorvida pelas raízes e volta
para a atmosfera pela transpiração das plantas. “A interceptação e a
transpiração, ou a evapotranspiração, fazem a água da chuva voltar para a
atmosfera não contribuindo para aumentar a vazão de um rio.”
Em
florestas tropicais, a evapotranspiração varia de 50% a 78% da
precipitação anual. Na pesquisa realizada em Cunha, esse número é de
aproximadamente 30%. Os pesquisadores explicam que o remanescente da
água infiltrada movimenta-se em profundidade e é armazenado nas camadas
internas do solo e na região das rochas, alimentando os cursos de água
pelo escoamento de base, isto é, do subsolo onde se localizam os lençóis
freáticos.
A relação entre árvores e água varia de acordo com o tipo de floresta
Embora
os processos que determinam os fluxos de água sejam semelhantes para as
diferentes formações florestais, a magnitude desses processos, que
depende das características da floresta, da bacia hidrográfica e do
clima, influencia a relação floresta-produção de água (escoamento total
do rio). Em florestas tropicais, a produção hídrica nas microbacias
varia de 22% a 50% da precipitação. “Em Cunha, onde a evapotranspiração
anual da Mata Atlântica é da ordem de apenas 30%, a produção de água
pela microbacia é de notáveis 70% da precipitação”, afirma Francisco.
Esse
mecanismo, em que a água percola o solo e alimenta gradualmente o
lençol freático, possibilita que um rio tenha vazão regular ao longo do
ano, inclusive nos períodos de estiagem. Nas microbacias recobertas com
mata atlântica em Cunha, o escoamento de base é responsável por cerca de
80% de toda a água escoada pelo rio, fato que proporciona a elas um
regime sustentável de produção hídrica ao longo de todo o ano.
Consequências da falta de vegetação
Ao
contrário, em uma bacia sem a proteção florestal, a infiltração da água
da chuva no solo é menor para alimentar os lençóis freáticos. O
escoamento superficial torna-se intenso fazendo com que a água da chuva
atinja rapidamente a calha do rio, provocando inundações. E, nos
períodos de estiagem, o corpo-d’água vai minguando, podendo até secar.
Um
outro fator drástico é que, enquanto nas bacias florestadas, a erosão
do solo ocorre a taxas naturais, pois o material orgânico depositado no
piso impedem o impacto direto das gotas de chuva na superfície do solo,
nas áreas desprovidas de vegetação há um intenso processo de carreamento
de material para a calha do rio aumentando a turbidez e o assoreamento
dos rios.
Segundo
Maurício, na microbacia recoberta com Mata Atlântica em Cunha, a perda
de solo no rio é da ordem de 162 kg/hectare/ano. “Esse valor é muito
inferior à perda de solo registrada para o estado de São Paulo, que
varia de 6,6 a 41,5 t/hectare/ano, dependendo da cultura agrícola, algo
como 12 toneladas num campo de milho, 12,4 toneladas numa área de
cana-de-açúcar, chegando a até 38,1 toneladas numa plantação de feijão”,
informa em tom de alerta.
A
floresta representa muitos outros benefícios para os sistemas hídricos.
Contribui, por exemplo, para o equilíbrio térmico da água, reduzindo os
extremos de temperatura e mantendo a oxigenação do meio aquático.
Promove, ainda, a absorção de nutrientes pelas árvores, arbustos e
plantas herbáceas evitando a lixiviação excessiva dos sais minerais do
solo para o rio.
Fonte : CicloVivo