A Bacia de Evapotranspiração, conhecida popularmente como “fossa de
bananeiras”, é um sistema fechado de tratamento de água negra, aquela
usada na descarga de sanitários convencionais. Este sistema não gera
nenhum efluente e evita a poluição do solo, das águas superficiais e do
lençol freático. Nele os resíduos humanos são transformados em
nutrientes para plantas e a água só sai por evaporação, portanto
completamente limpa.
Divulgado pela
Rede Permear,
principalmente em Santa Catarina, esse sistema tem algumas
características de construção e desenvolvimento diferentes da Fossa
Bio-Séptica ou Canteiro Bio-Séptico, mais usado na região central do
Brasil. Mas ambos tem a mesma origem na permacultura e compartilham os
mesmos princípios de funcionamento.
FUNCIONAMENTO E PRINCÍPIOS
Um pré-requisito para o uso da BET é a separação da água servida na
casa, em cinza e negra. Apenas a água negra, a que sai dos sanitários,
deve ir para a BET. A água cinza, aquela que sai da máquina de lavar,
pias e chuveiros, deve ir para outro sistema de tratamento como um
círculo de bananeiras que também está no projeto que disponibilizo no final deste artigo.
- Fermentação
A água negra é decomposta pelo processo de fermentação (digestão
anaeróbia) realizado pelas bactérias na câmara bio-séptica de pneus e
nos espaços criados entre as pedras e tijolos colocados ao lado da
câmara.
- Segurança
Os patógenos são enclausurados no sistema, porque não há como garantir
sua eliminação completa. Isto é realizado graças ao fato da bacia ser
fechada, sem saídas. A bacia necessita ter espaços livres para o volume
total de água e resíduos humanos recebidos durante um dia. A bacia deve
ser construída com uma técnica que evite as infiltrações e vazamentos.
- Percolação
Como a água está presa na bacia ela percola de baixo para cima e com
isso, depois de separada dos resíduos humanos, vai passando pelas
camadas de brita, areia e solo, chegando até as raízes das plantas, 99%
limpas.
- Evapotranspiração
Na minha maneira de ver, este é o principal princípio da BET, pois
graças a ele é possível o tratamento final da água, que só sai do
sistema em forma de vapor, sem nenhum contaminante. A evapotranspiração é
realizada pelas plantas, principalmente as de folhas largas como as
bananeiras, mamoeiros, caetés, taioba, etc. que, além disso, consomem os
nutrientes em seu processo de crescimento, permitindo que a bacia nunca
encha.
- Manejo
Primeiro (obrigatório), a cobertura vegetal morta deve ser sempre
completada com as próprias folhas que caem das plantas e os caules das
bananeiras depois de colhidos os frutos. E se necessário, deve ser
complementada com as aparas de podas de gramas e outras plantas do
jardim, para que a chuva não entre na bacia.
Segundo (opcional), de tempos em tempos deve-se observar os dutos de
inspeção e coletar amostras de água para exames. E observar a caixa de
extravase, para ver se o dimensionamento foi correto. Essa caixa só deve
existir se for exigido em áreas urbanas pela prefeitura para a ligação
do sistema com o canal pluvial ou de esgoto.
CONSTRUÇÃO PASSO-A-PASSO
- Orientação em relação ao sol
Como a evapotranspiração depende em grande parte da incidência do sol, a
bacia deve ser orientada para a face norte (no hemisfério sul) e sem
obstáculos como árvores altas próximos à bacia, tanto para não fazer
sombra como para permitir a ventilação.
- Dimensionamento
Pela prática, observou-se que 2 metros cúbicos de bacia para cada
morador é o suficiente para que o sistema funcione sem extravasamentos. A
forma de dimensionamento da bacia é: largura de 2m e profundidade de
1m. O comprimento é igual ao número de moradores usuais da casa. Para
uma casa com cinco moradores, a dimensão fica assim: (LxPxC) 2x1x5 = 10
m3.
- Bacia
Pode-se construir a bacia de diversas maneiras, mas visando a economia
sem descuidar da segurança, o método mais indicado de construção das
paredes e do fundo é o ferrocimento, como se pode observar na fotos
abaixo. As paredes ficam mais leves, levando menos materiais. O
ferrocimento é uma técnica de construção com grade de ferro e tela de
“viveiro” coberta com argamassa. A argamassa da parede deve ser de duas
(2) partes de areia (lavada média) por uma (1) parte cimento e argamassa
do piso deve ser de duas (3) partes de areia (lavada) por uma (1) parte
cimento. Pode-se usar uma camada de concreto sob (embaixo) o piso caso o
solo não seja muito firme.
- Câmara anaeróbia
Depois de pronta a bacia e assegurada sua impermeabilidade, mantendo-a
úmida por três dias, vem a construção da câmara que é super facilitada
com o uso de pneus usados e o entulho da obra. Como mostra a foto
abaixo, a câmara é composta do duto de pneus e de tijolos (bem
queimados) inteiros alinhados ou cacos de tijolos, telhas e pedras,
colocados até a altura dos pneus. Isto cria um ambiente com espaço livre
para a água e beneficia a proliferação de bactérias que quebrarão os
sólidos em moléculas de micronutrientes.
- Dutos de inspeção
Neste ponto pode-se iniciar a fixação dos 3 dutos de 50mm de diâmetro,
conforme os desenhos acima, para a inspeção e coletas de amostras de
água.
- Camadas de materiais
Como a altura dos pneus é de cerca de 55cm, que juntamente com a colmeia
de tijolos de cada lado vão formar a primeira camada (mais baixa) de
preenchimento da bacia (câmara), irão restar ainda 45 cm em média para
completar a altura da BET e mais 4 camadas de materiais. A segunda
camada é a de brita (+/- 10 cm). Nesse ponto eu tenho usado uma manta de
Bidim para evitar que a areia desça e feche os espaços da brita. A
terceira é a da areia (+/- 10 cm). E a quarta é a do solo (+/- 25 cm)
que vai até o limite superior da bacia. Procure usar um solo rico em
matéria orgânica e mais arenoso do que argiloso. A última camada é a
palha que fica acima do nível da BET.
- Proteção
Como a bacia não tem tampa, para evitar o alagamento pela chuva, ela
deve ser coberta com palhas. Todas as folhas que caem das plantas e as
aparas de gramas e podas, são colocadas sobre a bacia para formar um
colchão por onde a água da chuva escorre para fora do sistema. E para
evitar a entrada da água que escorre pelo solo, é colocada uma fiada de
tijolos ou blocos de concreto, ao redor da bacia para que ela fique mais
alta que o nível do terreno.
- Plantio
Por último, deve-se plantar espécies de folhas largas como mamoeiro (4),
bananeiras (2), taiobas, caetés, etc. As bananeiras podem ser plantadas
de diversas maneiras. Mas eu prefiro usar o rizoma inteiro ou uma cunha
(parte de um rizoma) com uma gema vizível. Após fazer os buracos (no
mínimo 30x30x30 cm) deve-se enchê-las com bastante matéria orgânica
(palhas, folhas, etc.) misturada com terra. O rizoma deve ficar há uns
10 cm, em média, abaixo do nível do solo. Quando plantada a partir de
rebentos (mudas), posicione-os inclinados para fora, isso facilitará a
colheita e o manejo das bananeiras.
ÁLBUM DE FOTOS
Acrescentarei as fotos da BET de minha casa assim que tiver completa.
USO EM ÁREA URBANA
Na região sul do Brasil tem diversas BETs em áreas rurais em
funcionamento. Não há nenhum impedimento legal para sua instalação. Mas
nas cidades, normalmente, tem uma legislação rígida normalizando os
sistemas de tratamento residenciais e que impedem o uso desses sistemas.
Em Criciúma, tivemos a primeira implantação de uma BET em área urbana
legalizada e aceita pela prefeitura, que poderá incentivar o seu uso
para diminuir a demanda por ETEs públicas. Neste momento a cidade está
implantando a primeira ETE na cidade para o tratamento do esgoto. E que
sabemos não resolverá o problema totalmente e nem por muito tempo. Logo
deverá ser ampliada ou duplicada. Até porque todas as águas servidas são
misturadas e contaminadas, aumentando o problema para as ETEs. E ainda
tem um custo de manutenção que deverá ser repassados aos usuários. A BET
tem custo ZERO de manutenção. O tratamento é biológico, sem materiais
químicos.
Para auxiliar os interessados, disponibilizo abaixo o RAP (Relatório
Ambiental Prévio) que fiz para solicitar a licença de implantação do
sistema completo (Bacia de Evapotranspiração e Círculo de Bananeiras).
Como esses sistemas ainda são desconhecidos da maioria, o RAP cumpre a
missão de explicá-lo tecnicamente aos responsáveis pela área sanitária
da cidade. Alerto que não é uma missão fácil, precisa-se de paciência e
dedicação para que o sistema seja compreendido e liberado para
construção. Os técnicos tem suas razões legais para questionar o projeto
e normalmente exigem que o sistema tenha uma saída para o canal pluvial
ou de esgoto da prefeitura. O projeto sanitário (abaixo) deve ir como
anexo do RAP e mostra como isso pode ser feito sem prejudicar o sistema e
ainda serve de ponto de observação de extravase da água.
Arquivos PDF do projeto e do relatório (RAP) para donwload:
Modelo de RAP (Relatório Ambiental Prévio) (191 Kb)
Modelo de planta do sistema completo de tratamento (1,6 Mb)
Na Austrália e em outros países essa já é uma prática comum,
divulgadas pelo movimento da permacultura. Vamos fazer o nosso movimento
seguindo os projetos a risca e ainda tentando melhorá-los no sentido da
segurança e da economia.
Faça bom proveito e envie suas sugestões e dúvidas.