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MINAS RURAL 1427 - 10/05/24
A troca de vegetação nativa por soja pode ter agravado as enchentes no Rio Grande do Sul?
fonte: BBC
- Author,Leandro Prazeres
- Role,Da BBC News Brasil em Brasília
As inundações que atingiram o Rio Grande do Sul nas últimas semanas já levaram à morte de mais de uma centena de pessoas e deixaram outras milhares desalojadas.
A chuva não vem dando trégua, os boletins meteorológicos e hidrológicos apontam para um possível recrudescimento da situação na região nos próximos dias e as enchentes já são consideradas o pior evento climático da história do Rio Grande do Sul e um dos piores do Brasil.
A dimensão da tragédia, as perdas de vidas humanas e a destruição de comunidades inteiras têm despertado uma discussão sobre os fatores que levaram a essa catástrofe ou que poderiam ter ajudado a diminuir sua intensidade.
Um dos aspectos apontados por especialistas ouvidos pela BBC News Brasil é o possível impacto da redução da vegetação nativa no Estado.
Dados produzidos pela organização MapBiomas e obtidos pela BBC News Brasil mostram que, entre 1985 e 2022, o Rio Grande do Sul perdeu aproximadamente 3,5 milhões de hectares de vegetação nativa.
Isso é o equivalente a 22% de toda cobertura vegetal original presente no Estado em 1985 formada por florestas, campos, áreas pantanosas e outras formas de vegetação nativa.
Os dados mostram ainda que ao mesmo tempo em que isso acontecia, houve um aumento vertiginoso de lavouras de soja, silvicultura e da área urbanizada do Estado.
Cientistas ouvidos pela BBC News Brasil afirmam que a perda de cobertura vegetal original pode ter contribuído para as dimensões das inundações que afetaram o Estado porque a vegetação nativa:
- diminui a velocidade com a qual a enxurrada chega ao leito dos rios;
- aumenta a quantidade de água infiltrada no solo, o que diminui a quantidade de água disponível para inundações;
- protege o solo diminuindo a quantidade de sedimentos que assoreiam os rios da região.
A Secretaria do Meio Ambiente (Sema) do Rio Grande do Sul diz que tem "atuado em várias frentes no intuito de garantir a proteção e recomposição de áreas de vegetação nativa no Estado."
"Os reflorestamentos e a restauração de ambientes naturais são entendidos como essenciais e estão contidos nos projetos prioritários do Estado", diz a nota enviada pela pasta.
Cidades e florestas 'artificiais'
A relação entre a perda de vegetação nativa e os impactos das inundações no Rio Grande do Sul começou a ser feita por pesquisadores que estudam a ocupação do solo no Estado gaúcho há décadas.
Um deles é o pesquisador do MapBiomas Eduardo Vélez, um dos responsáveis pelo levantamento feito pela organização.
O MapBiomas é uma iniciativa que reúne organizações não-governamentais e empresas de tecnologia, e que utiliza imagens de satélite para estudar a mudança nos padrões de uso do solo em todo o Brasil.
Vélez explica que o levantamento tomou como ponto de partida o ano de 1985 porque é o primeiro ano da série histórica do conjunto de satélites Landsat.
"Para estudar esse fenômeno, a gente precisa de dados comparáveis de longo prazo", explica Vélez.
O pesquisador explica que o levantamento comparou as coberturas vegetais de diferentes categorias ao longo dos anos para estimar a quantidade de vegetação nativa perdida e o que ocupou o seu lugar no Rio Grande do Sul.
Vélez diz que a perda de vegetação nativa no Rio Grande do Sul atingiu o Estado como um todo, mas quase um terço dela se deu na bacia hidrográfica do Guaíba, uma das mais afetadas.
Lá, a perda de vegetação nativa foi de 1,3 milhão de hectares.
"O Rio Grande do Sul tem um bioma diferente da Amazônia, por exemplo. Temos algumas florestas nativas, mas a maior perda não se deu pelo desmatamento de florestas. Essa perda se deu, na maior parte, nas formações campestres", diz Vélez.
As formações campestres do Rio Grande do Sul são um tipo de vegetação adaptada ao clima sub-tropical do Estado composta, em sua maioria, por gramíneas e arbustos de pequeno porte.
Em geral, ela vem sendo utilizada historicamente nas atividades de pecuária extensiva, preservando, segundo especialistas, suas características originais biológicas e suas funções ambientais em relação à chuva e ao solo.
De acordo com o MapBiomas, o Estado perdeu 3,3 milhões de hectares em formações campestres entre 1985 e 2022, quase a totalidade de tudo o que o Estado perdeu em vegetação nativa no período.
Trata-se de uma perda de 32% em relação ao que havia desse tipo de vegetação em 1985.
O MapBiomas também mostra qual o destino dado às áreas onde a vegetação nativa foi suprimida.
Os dados apontam que houve um crescimento de 366% no total da área destinada à lavoura de soja no período.
Em 1985, o Estado tinha uma área de 1,3 milhão de hectares ocupada pela soja. Em 2022, essa área saltou para 6,3 milhões. O crescimento foi de 4,99 milhões de hectares.
Essa área é maior do que o total da perda de vegetação nativa porque, segundo Vélez, além de crescer sobre as áreas naturais do Estado, a soja também avançou sobre outras atividades como pastagens.
De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), vinculada ao Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), o Rio Grande do Sul era, em junho de 2023, o terceiro maior produtor de soja do Brasil, atrás de Paraná e Mato Grosso.
Outra atividade cuja área cresceu mudando a configuração do solo do Rio Grande do Sul é a silvicultura.
A silvicultura consiste na plantação de florestas novas ou no manejo de florestas nativas para a sua exploração comercial.
No Rio Grande do Sul, a principal forma de silvicultura é a plantação de florestas novas de espécies como eucalipto, pinus e outras espécies que são usadas para a produção de madeira, lenha e celulose.
De acordo com o MapBiomas, a área destinada à silvicultura no Estado saltou de 79 mil hectares para 1,19 milhão de hectares, um crescimento de 1.399%.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Rio Grande do Sul é o quinto maior Estado do Brasil em silvicultura, atrás de Paraná, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Minas Gerais.
O levantamento também mostra que houve um crescimento de 145% nas áreas urbanizadas do Estado no período estudado.
Em 1985, as áreas urbanizadas saíram de 97 mil hectares para 238.607 em 2022.
De acordo com o IBGE, a população do Estado era de 8,4 milhões em 1985. Em 2022, a população estimada era de 10,8 milhões.
LEIA MAIS EM: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cjmkkxzv2k2o
quarta-feira, 15 de maio de 2024
Plantas Alimentícias Não Convencionais podem ser aliadas contra a fome e na busca por uma alimentação saudável !!!!
Fonte: IDR
Apesar de pouco conhecidas podem auxiliar no combate à fome, no barateamento dos alimentos e na promoção da saúde
As Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC) representam um tesouro nacional ainda pouco explorado. O Brasil, um país de biodiversidade inigualável, abriga cerca de 10 mil espécies dessas maravilhas naturais, que carregam um enorme potencial para revolucionar nossa alimentação. Espécies como ora-pro-nóbis, azedinha e taioba são exemplos dessas plantas que, além de serem altamente nutritivas e acessíveis, podem ser peças-chave na luta contra a fome e na promoção de uma alimentação mais saudável e sustentável. Ainda subutilizadas na culinária brasileira, as PANC merecem atenção para que possam ser integradas de forma mais ampla em nossa dieta.
As PANC têm inúmeras vantagens nutricionais e de cultivo. Elas estão presentes em quase todos os quintais e dispersas nos diversos biomas brasileiros, inclusive sendo classificadas como ervas invasoras ou daninhas na visão convencional, além de serem resistentes a doenças e insetos-praga.
Vantagens econômicas e ambientais - De acordo com Julio Carlos Bittencourt Veiga Silva, doutor em Meio Ambiente, engenheiro agrônomo da unidade de Guaraqueçaba do IDR-Paraná (Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná - Iapar-Emater), devido à esta alta resiliência e menor dependência de insumos externos, o custo de produção é bem inferior, e possuem grande diversidade de compostos funcionais, resultantes do disparo de processos metabólitos decorrentes da exposição às condições naturais e os estresses climáticos. “Elas têm altos teores de vitaminas, minerais, aminoácidos, fibras, proteínas vegetais e outras substâncias importantes para a saúde, portanto tornam-se interessantes tanto para a subsistência das famílias quanto para a comercialização dos produtos, sejam como alimentos, insumos agroindustriais, complementos ou suplementos nutricionais, nutracêuticos e até farmacológicos”, afirma Julio.
Equilibrar ofertas e demandas é um desafio para a consolidação das PANC nas várias cadeias produtivas potenciais. Elas podem ser fator fundamental para o sucesso de uma transição agroecológica e gradativa evolução dos sistemas de produção.
Julio ressalta que como grande parte delas se manifestam espontaneamente nas lavouras, como “mato”, e já são componentes da biodiversidade dos locais em que se encontram, se as mantivermos e propagarmos, estaremos preservando a biodiversidade local. “Elas podem ter múltiplas funções em um ecossistema, além da utilização como alimento. Se forem manejadas adequadamente, entre as linhas de cultivo comercial, protegem o solo como uma cobertura viva, melhoram sua estrutura devido ao desenvolvimento radicular e acabam melhorando a matéria orgânica do solo, pela reposição de carbono. Ainda como benefício para o sistema, elas podem ser fonte de alimento ou atrativas de insetos benéficos, parasitas ou predadores de outros insetos”.
Desafios - Mas, por que as PANC ainda são desconhecidas da maioria das pessoas? Segundo Giovana Faneco Pereira, professora, pesquisadora e extensionista do Departamento Acadêmico de Ciências Agrárias da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), campus Pato Branco, são muitos os desafios e um deles é a mudança de hábito. “Uma das primeiras perguntas que as pessoas podem fazer sobre o assunto seria ‘por que comer ‘matos’ se eu tenho acesso a verduras e frutas no mercado’ retorno com outra pergunta: ‘será que temos mesmo esse acesso? Esse acesso é para todos? Os consumidores estão habituados com o que tem disponível nas prateleiras dos supermercados e, assim, estão acostumados a um paladar limitado”.
Para Giovana outro ponto que distancia as pessoas das PANC é a associação dessas espécies a momentos de sofrimento, de fome, pois muitas plantas acabaram entrando na dieta da família por não terem outras opções. “É possível mudar isso com um trabalho junto às escolas com as crianças, pois o paladar delas está em desenvolvimento e acaba ficando limitado pela influência dos próprios familiares. Já com os agricultores o desafio é a conexão com os consumidores. É um trabalho que deve ser realizado em conjunto”.
Diversidade - O Brasil é um dos países de maior diversidade de espécies de plantas do mundo, porém, explica Giovana, nossa alimentação é colonizada. “Deixamos de lado os alimentos nativos tradicionais e consumimos alimentos trazidos de fora, introduzidos de outras culturas e desconhecemos o que é nosso, o que é daqui. A grande maioria das pessoas não tem ideia da quantidade de plantas alimentícias encontradas em solo brasileiro, especialmente as nativas”.
Para Giovana, o primeiro passo é conhecer o que temos ao nosso redor, o que não é muito fácil, pois perdemos a capacidade de conhecer e especialmente reconhecer espécies de plantas e, com isso, o uso potencial que cada uma apresenta. “Um exemplo disso foi uma experiência que tive em Manaus. Pensei Amazônia, local de uma megadiversidade de espécies e conhecimento tradicional. No mercado o que encontro? Alface por 10 reais, abobrinha por 25 reais, brócolis e couve-flor por 45 reais. E as espécies nativas? Nada! Só tive acesso às espécies amazônicas nas feiras, nas ruas, nos semáforos”.
Giovana ressalta a necessidade de incentivos que auxiliem na inclusão das PANC na alimentação cotidiana das pessoas. Além do trabalho de divulgação que ainda é um trabalho de “formiguinha”. “Produzir alimento a partir da diversidade local pode auxiliar na segurança alimentar da população ou comunidade, pois muitos agricultores familiares, mesmo produzindo alimento, sofrem com a insegurança alimentar”.
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